quinta-feira, 9 de dezembro de 2010



Malcriação justa (digo eu)...

Lavam-nos diariamente o cérebro, que tem de ser, que a culpa não é de ninguém - a não ser nossa, claro – que é preciso aceitar, retroceder, regredir, minguar, reaprender a linguagem da submissão e da acomodação, que vem aí uma nova era de escravidão, de miséria, o regresso aos “muito obrigado, meu rico senhor, eu entendo que não tenha para me dar, sim eu percebo que mesmo o meu rico senhor não tem outra alternativa senão sobrecarregar-me mais um bocadinho, mas mesmo assim agradeço-lhe, meu rico senhor”...
Não dizem tudo isto mas a gente percebe.
Digo eu que nasci torto.
Mas hei-de endireitar-me... ou talvez já não.

Porque me lembro de ser jovem, de reagir, de reclamar, de pensar por mim, de pensar nos outros... Ainda há quem pense para além do seu próprio umbigo?.... duvido.
Nesta era do salve-se quem puder, de objectivos materialistas e individualistas, de um imposto e proclamado valor supremo universal chamado competitividade, que não passa afinal da submissão do colectivo ao individual, mas com o senão de ser um individual alheio que por isso parece anónimo e comum... Mas é afinal só dos tais meus (teus, nossos...) ricos senhores, que determinam quais são os objectivos e regras dessa competitividade...
Que não tem regras para e em si mesma, só para os que nela são peões, a mão-de-obra..., a gente.

Nesta sua era a juventude foi manietada por conceitos de sobrevivência que se sobrepõem à subserviência, e foi sobretudo alienada e orientada para conceitos de vida individualistas, de sobrevivência a todo o custo e por isso não chega a perceber que há formas de contestar o estado das coisas, de rugir, de protestar, de se unir e até de fazer abanar os que determinam o ritmo e orientação que as coisas levam.
E, pior, não percebem que nessa actividade e associação de esforços por causas válidas e em prol de uma vida mais justa para a generalidade poderiam encontrar o que procuram lá nos seus refúgios de solidão e alienação, nos quartinhos onde os sonhos lhe chegam difusos, confusos e desordenados, por lhes faltar até uma direcção...
Porque há emoções, relacionamentos humanos e passionais reais na associação e dedicação a causas que não se podem comparar aos obtidos de um monitor nem do laisser faire de um charro...
E o mais perverso é que nunca uma geração teve formas tão acessíveis e fáceis para comunicar e reagir!
Porque existe a net, esse instrumento de massas que se poderia tornar vocacionado, não à laracha, à troca de vaidades intelectuais e criativas ou ao convívio e mesmo engate sem obrigação de vestir o casaquinho nem sair do quentinho, mas ao debate, à associação de ideias e interesses e à conjugação de estratégias, à consertação de reacções articuladas, já não restringidas à infra escala dos grupelhos esquerditas, dos comícios e acções de militantes decididas numa sala ou passadas de boca em boca mas ampliada à escala e dimensão que se quiser imaginar.
Porque a net pode ser isso mas é a última coisa que parece ocorrer-lhes.
Claro que é aberta ao controlo do poder, mas mesmo assim teria certamente um efeito moderador sobre ele, porque os poderes percebem e temem o poder.
E reagir, na maioria das vezes ingloriamente foi, é e será sempre o único poder da gente, não vale a pena iludir-nos nem acreditar outra vez no Pai Natal.
Porque todos sabemos que quem põe as prendinhas no sapatinho é o salário ganho pelo suor. O resto é, será e sempre foi ficção, gostosa mas mentirosa.
Não, em vez de criarem consciência desse incomensurável poder que lhe passa pelas mãos dispersam-se em passividades fúteis e inactividades pré-formatadas que existem por lá, como as quintas e toda a bonecada e afins ao dispor dos utilizadores, dispersando as energias na tentativa de escavar um qualquer modo de vida ou alienando-se em hobbys, sexo desorientado ou coisas bem piores, como a droga, que deixou de ser notícia sem deixar de proliferar em formas cada vez mais socializadas e massivas.
Porque para as novas gerações entaladas entre o desespero, o desemprego e a ausência total de nocções de solidariedade a net é só isso, o Face, os jogos, o trecolareco nos messengers, skypes e afins, sobretudo porque se lhes tirou à nascença conceitos tornados caducos e obsoletos, como solidariedade, força da união, (e se algum cota tentou preservá-los também não resulta, porque há a pressão do meio), etc., banidos por tudo isso se lhes afigurar meras e pirosas foleirices, tão fora de tudo o que os atrai, principalmente das noções de sobrevivência e mateirice que a competitividade lhes inculca e exige.

Estado de competitividade permanente que se viu agora não passar de um conjunto de acasos fortuitos e não parametrizados ou controlados por nada nem ninguém, que se foi aguentando nas canetas fruto só da incerta, instável, imponderada, irresponsável, inconsciente e casual tendência natural das coisas para criarem equilíbrios por si mesmas.
Por mero instinto de sobrevivência, digo eu, mas que um dia pode falhar. E agora falhou...
Porque o desenvolvimento em curso nunca teve nem seguiu planos ou estratégias ponderadas, nem tinha qualquer controlo sobre si mesmo nem sobre os efeitos –previstos e imprevistos - que podia e pode produzir, uma balda sem rei, roque ou orientação consertada e controlada, nunca passou de deixar o mundo e a gente dele ao livre arbítrio do mais selvagem liberalismo, que finalmente deu rédea solta aos infinitos e cruzados jogos de interesses e influências dos diversos poderes.
Que por acaso lá se ia conseguindo equilibrar e evitar o descalabro emergente por obra e graça da tal tendência defensiva e natural dos acasos...para evitarem catástrofes.
Mas tanto fizeram que nem essa conseguiu resistir e agora cá vamos por aí abaixo, e a descer todos os santos ajudam, neste caso até é o inverso mas isso não interessa nada, e por isso os meus ricos senhores vão diariamente às televisões, aos debates e a todo o lado dizer-nos que é preciso paciência e não fazer ondas, que estão a fazer tudo para evitar o descalabro, mas que para isso temos que amochar, sempre mais e sempre mais.
Como se a culpa fosse nossa.
Que não é nem podia ser, que me lembre nunca faltámos ao que nos foi exigido, nunca gazetámos às eleições (todos de uma vez, porque cada vez vamos menos, lá isso é verdade...), ao pagamento dos impostos nem ao trabalho.
E inventaram também o consumo que nós confundimos com qualidade de vida...
Mas ele e ela não passam da forma possível e essencial à concretização do tal liberalismo competitivo, que produz muito e não podia por isso restringir-se só a dar mordomias aos meus ricos senhores. É por isso que agora temos tantas coisas, pois é...
Que depois de pagas - e a maioria obriga-nos a prestações para toda a vida útil- sobra pouco, pois é...
E agora vão-nos à reforma, para os que lá conseguirem chegar, que se e quando lá chegarem será já pouco mais que uma sopa dos pobres...
É... ou vai ser... ou vai é voltar a ser... pois vai!
Outra coisa incrível é querem tornar o despedimento ainda mais liberal. Falam da legislação laboral como se ela fosse ainda um bastião de direitos dos que não querem fazer nenhum! Mas há muito que eles despediram esses porque essa mesma legislação o permite já há muito.
Há muito que só usam vínculos precários de emprego, avenças, contratos a prazo, empresários em nome individual do recibo avulso, etc.
Há que tempos que não há admissões para o quadro de efectivos (bem sei que há uns que lá vão dar, mas... família é família! E se não for o tio é de certeza por permuta...) e até as promoções desses e dos novos são sempre feitas em comissão de serviço, o que significa que caso o comissário deixe de ser útil ou necessário o podem fazer regressar ao posto original, no caso dos efectivos, ou ao desemprego, para a generalidade dos casos.
E mesmo a esses, aos efectivos, podem transitá-los para empresas de fachada, ACE’s e similares, ou seja empresas sem capital e património próprios, algumas mesmo sem uma sede, e que gerem de acordo com contratos de prestação de serviços a terceiros.
Contratos que terminando ou sendo perdidos deixam essas mesmas pessoas sem terem onde ir reclamar os seus direitos. Apesar de ninguém lhos negar, enmtenda-se. Brilhante...
Sim, porque podem ter razão legal (da moral já lá vamos...) e esta ser-lhe até reconhecida mas não tendo essas “entidades de fachada” património onde ir reclamar direitos o melhor resultado nunca passará da vitória moral.
(ora aí está algo que afinal permanece a favor dos trabalhadores, a moral! Como sou tendencioso, credo!...)
Essas empresas são uma nova espécie de bastardos ilegítimos (bastava um adjectivo mas sabe bem insuflar...) directamente ao serviço das pequenas, médias e grandes empresas com cara legal e património (porque lhes permitem esvaziar-se do respectivo quadro de pessoal para leas, daí o termo rtransmissão...), mas que não são legalmente as reconhendo como ligadas a si.
Uma maravilha da legislação portuguesa que desde Dezembro último permite às empresas com quadro efectivo lançar para o mercado esses filhotes anónimos e não perfilhados oficialmente, que são meros refúgios temporários de acolhimento de unidades de negócio ou simplesmente parcelas delas – o que na prática significa que se pode considerar como parcela da unidade aquele que antigamente se designava por trabalhador... – da empresa mãe (nunca como aqui a palavra P... se justificava mas, enfim, sejamos elegantes até ao fim), alegando que não têm vocação para esse tipo de actividade.
Porque qualquer vínculo ou direito de retorno ao posto original (que só pode ser accionado se houver clara irregularidade por parte da nova entidade patronal) desaparece definitivamente um ano após a transmissão.
Se a dita empresa encerrar (e como elas proliferam em função dos contratos que a justificam esse é o fim mais provável) o trabalhador – que pode ser até gestor, a coisa já vai nesse nível, se não vai – fica com os seus direitos e anos de casa dados ao empregador original, que transitam com ele – essa foi a justificação moral alegada para esta benfeitoria aos direitos dos trabalhadores...-, irremediável e imoralmente perdidos, porque não havendo património não há onde ir ressarcir-se deles.
Mas e honra seja feita ao legislador de tal preciosidade, moralmente ninguém lhe tira nada, muito menos a vitória moral!...

E este direito está agora consagrado e devidamente legislado, sem quaisquer enquadramentos definidores do que se entende por uma unidade de negócio fora da vocação da entidade original, deixando todos os por conta de outrem sem qualquer critério de protecção.
Ou seja, por exemplo um construtor civil pode considerar-se sem vocação para ter unidades de negócio de pedreiros, carpinteiros, serralheiros, vidraceiros, canalizadores, afagadores, trolhas, etc., etc.
Pode lá ficar só ele (...a secretária se for jeitosa e mostrar disponibilidade é provável que se aguente... até aparecer outra mais disponível e...apetecível, claro).
E curiosamente, ou talvez não, esta é talvez a maior prova da incompetência e ignorância dos meus (teus, nossos) ricos senhores: é que existe isto tudo, mais o resto que já se sabia sobre poderem despachar a gente por inadapatação tecnológica e a maioria deles nem sabe!
Por isso querem mais e mais liberalização nos despedimentos.

É por isso que hoje vou mesmo ser malcriado:
Vão-se F..., meus ricos senhores!

2 comentários:

  1. Não foste malcriado....são palavras que certamente nos apece dizer nesta altura do campionato,Portugal esta neste momento ligado a um ventilador, talvez ligado a mais ventiladores certamente um não chega.........
    Mas nesta época Natalicia vamos pensar positivo

    A Melhor mensagem de Natal é aquela que sai em silêncio de nossos corações e aquece com ternura os corações daqueles que nos acompanham em nossa caminhada pela vida.DEsejo a vç Feliz Natal ...Anita de Castro

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  2. ...olá...nada por dizer...nem censurar...afinal até eu que não sou de dizer palavras fortes concordo contigo...o único problema é que dizendo tu até a palavra final... nada tenho a acrescentar...a net...é existe...para o bem...e...para o mal...de segunda a domingo (...não só nas quintas~)...24h sobre 24h...um instrumento que cada um de nós tem na mão...e...pode usar como entender...talvez...acredito...um dia seja usado por todos de uma forma mais útil...bom Natal para aí...para todos os que amas...com saúde...sobretudo...beijo amigo...Mª José Lacerda

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